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domingo, 29 de maio de 2011

Carruagens de Fogo

Dia 04/06

Sala Redenção 15:30

A inocência da civilização: o esporte na Belle Epoque.

Carruagens de fogo (Chariots of fire).





Conheça os Palestrantes

Carla Brandalise é professora de História Moderna e Contemporânea da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; professora permanente do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais-UFRGS Tem experiência na área de História Política, com ênfase em política contemporânea, atuando principalmente nos seguintes temas: Nações e Nacionalismos; Regimes políticos autoritários; História da extrema-direita européia do pós- Segunda Guerra Mundial; Fluxos migratórias contemporâneas; Relações Internacionais; e História do Tempo Presente.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/3380240439932303








Miguel Stédile é mestrando em História na UFRGS. Seu tema de pesquisa é: “Da fábrica à várzea: futebol e identidade operária em Porto Alegre (1930-1937)”. É professor do Instituto de Educação Josué de Castro.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/2823903016812131

Universíade - 1963 - Porto Alegre

Olímpiadas em Porto Alegre?

Porto Alegre e o Esporte:
Civilização e Independência nos anos da Guerra Fria*

Charles Sidarta Machado Domingos**

Porto Alegre foi sede dos Jogos Mundiais Universitários (Universíade-63) no ano de 1963. Foi a primeira vez que esses jogos foram realizados fora do continente europeu. Em um mundo bastante dividido pela lógica da Guerra Fria realizar um evento esportivo que congregasse atletas dos dois blocos econômico-sociais em disputa era uma grande atração, despertando muita curiosidade.
Não se passara um ano ainda do evento mais quente da Guerra Fria: a Crise dos Mísseis. O mundo vivia o pavor de uma guerra nuclear iminente. E no Brasil isso não era diferente. Mas ao mesmo tempo em que o medo espraiava-se entre as pessoas, o esporte era capaz de proporcionar momentos de alegria e de congratulação entre os povos. Uma competição esportiva como a Universíade-63 despertava paixões, tanto pela prática desportiva quanto pelo sentimento de patriotismo.



O ano de 1963 no Brasil foi um ano de fortes embates político-ideológicos. Em 06 de janeiro houve o Plebiscito no qual a população optou pelo retorno ao sistema presidencialista de Governo. As posições dos maiores partidos políticos se modificavam em processo acelerado. O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) se radicalizava cada vez mais à esquerda, tendo no discurso nacional-reformista seu mote.[1] O Partido Social Democrático (PSD) até então seu tradicional aliado no tempo da experiência democrática (1945-1964) estava em processo de distanciamento político em direção à União Democrática Nacional (UDN), agremiação de cunho liberal-conservador situado à direita no espectro político do período.
No Rio Grande do Sul assumia o Governo do Estado o pessedista Ildo Meneghetti. Destoando da política brasileira, a política gaúcha há muito já expressava o fenômeno de um PSD udenizado.[2] A tradição da bipolaridade política gaúcha se acentuava ainda mais numa conjuntura internacional também bipolar. No entanto, trazer a Universíade-63 para Porto Alegre se não foi um momento de trégua política, pois os ânimos assim não o permitiam, foi um período de tolerância.

A origem dos Jogos Mundiais Universitários

                   Os Jogos Mundiais Universitários – Universíade – foram realizados em Porto Alegre, no sul do Brasil, no ano de 1963. A Universíade nasceu de um esforço conjunto entre as duas grandes entidades do esporte universitário no mundo: a Federação Internacional do Esporte Universitário (FISU– Federation International Sport University) com sede em Paris e a União Internacional dos Estudantes (ISU – International Students Union) sediada em Praga. Ambas entidades foram fundadas em 1949 e tinham origens em entidades esportivas fundadas na década de 20 que não conseguiram se manter no período da Segunda Guerra Mundial.



                   Nessa época a FISU organizava as disputas esportivas entre os países capitalistas e a ISU entre os países socialistas, havendo ocasionalmente participação de algum país de um bloco numa disputa patrocinada pelo outro.
                   Em 1957 a Federação Francesa de Esportes Universitários organizou o Campeonato Mundial de Esportes Universitários, que reuniu estudantes dos dois blocos em que o mundo via-se dividido. Embora tenha sido uma disputa de pequenas proporções, ele acabou dando estímulos para a realização de um grande campeonato, no qual pudessem participar livremente e em grande número atletas das duas formações sociais existentes.



                   No ano de 1959, FISU e ISU concordaram em participar dos jogos organizados em Turim pela Associação Italiana de Esportes Universitários. A Associação Italiana de Esportes Universitários batizou esses jogos de Universíade, uma derivação das palavras Universitàrio e Olimpìade. Participaram desse certame 43 países e mais de 1400 atletas. Foi também estipulado nessa edição uma bandeira em forma de U para representar o evento e a elaboração do estatuto da FISU, que a partir desse momento englobaria as duas entidades e passaria a ser responsável pela continuidade dos Jogos Mundiais Universitários. Afinal, o esporte, segundo Carraveta, “entendido como jogo competitivo, se encontra em todas as sociedades, é um dos poucos conceitos culturais universais da humanidade” (CARRAVETA, 1997, p.24). No Estatuto da FISU, no seu artigo 2º lê-se: “A FISU persegue seus objetos esportivos e fraternos, sem consideração ou discriminação política, religiosa ou de natureza racial” (BOLETIM DA UNIVERSÍADE 63, Porto Alegre, nº 01, agosto, 1963).

Pensando e agindo
                   Era preciso um grupo forte e coeso para organizar os Jogos Mundiais Universitários. O trabalho era grande, o tempo pequeno, e o dinheiro curto. Mas os jovens universitários gaúchos não se intimidaram. Montaram um comitê e deram início aos trabalhos. O Comitê Executivo era formado por Henrique Halpern, Edgar Laurent, Darci Votto de Araújo, Adonis Escobar e Carlos Alberto Giulian. O diretor técnico foi Luiz Augusto Bastian de Carvalho. E para o Comitê Organizador foi escolhido o Sr. José Antônio Aranha, Secretário da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul e representante direto do Governador Ildo Meneghetti (BOLETIM DA UNIVERSÍADE 63, Porto Alegre, nº 1, agosto, 1963).
                   O país estava vivendo séria uma crise financeira.[3] Não havia muitos recursos destinados para a organização dos Jogos Mundiais Universitários. Eles ocorreram no mesmo ano dos Jogos Pan-Americanos de São Paulo, onde tinha sido destinado um montante elevado de verbas federais. A solução foi recorrer ao Governo do Estado, na figura do conservador Ildo Meneghetti.            
                        
O Governo do Estado do Rio Grande do Sul procurou dar todas as facilidades para os organizadores. Prova disso é a Ordem de Serviço – número 27– de 21 de agosto de 1963: O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL determina a todos os órgãos da administração estadual, inclusive autárquicos, seja dada prioridade na solução das solicitações feitas pelo Presidente do Comitê da Organização da Universíade 63, Doutor JOSÉ ANTÔNIO ARANHA. O PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 21 de agosto de 1963 (KOCH, 2003, pp. 33).
                         
                   Mas a cidade não estava preparada para receber um evento desse porte. Havia muitas melhorias a serem feitas. O prefeito de Porto Alegre, Loureiro da Silva, determinou que a Divisão de Limpeza Pública mantivesse em dia toda a Radial Leste, zona compreendida pelas ruas Ramiro Barcelos, São Luís, Luís de Camões e Avenida Ipiranga, área próxima onde estava sendo construído o ginásio que serviria para os jogos de basquete e vôlei da Universíade.  Também determinou que a Rua da Praia e adjacências fossem limpas e tivessem o calçamento restaurado. Além disso, pedia providências para que todos os pontos turísticos da cidade recebessem um tratamento especial. Afinal, a ocasião seria uma grande projeção para a cidade. E não se poderia perder essa oportunidade (CORREIO DO POVO, 11/08/63, pp. 25).
                  
A cidade acolhe os Jogos
                  No início da década de 1960, Porto Alegre era uma cidade em constante crescimento urbano. Mas ainda não tinha um parque esportivo suficientemente grande para abrigar uma competição como os Jogos Mundiais Universitários. Essa era uma das grandes questões a ser resolvida pelos organizadores da Universíade-63.



                   Conseguiram o compromisso do Governo do Estado, através do Secretário da Fazenda e diretor do Comitê Organizador, José Antônio Aranha, para a construção de um ginásio. Foi construído, em tempo recorde, 94 dias, o maior ginásio esportivo do sul do país, com capacidade para 10000 pessoas. Foi batizado Ginásio Universíade e hoje é conhecido como Ginásio da Brigada Militar.



                   As competições de atletismo, que acabaram sendo o ponto alto dos Jogos Mundiais Universitários, foram realizadas no Estádio Olímpico, do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense.[4] Para a competição de esgrima houve uma inovação. Foram aproveitados os Armazéns A e B do Cais do Porto, que estavam desativados e sem uso. Os jogos de basquete e vôlei foram realizados no recém construído ginásio. As provas de ginástica, natação e saltos ornamentais foram realizadas no Grêmio Náutico União. Os jogos de tênis na Sociedade Leopoldina Juvenil e o pólo aquático no Petrópole Tênis Clube.

Sobre o Esporte e a Civilização nos tempos da Guerra Fria
            O mundo estava dividido naquele início da década de 1960. Era o auge da Guerra Fria e os países do globo acabavam alinhando-se as duas superpotências de então. No entanto esse alinhamento era muito mais favorável as superpotências do que aos países alinhados, pois a Guerra Fria era uma constante dominação sobre os povos e as economias locais.
                   No Brasil, a Política Externa Independente procurava uma nova forma de relacionar-se com os demais países do globo. E uma forma de atração a esses países, com vistas comerciais e econômicas, poderia ser o esporte. Não há fator de aglutinação social melhor do que o esporte. O esporte é uma referência positiva em qualquer sociedade, seja ela capitalista ou socialista. É através do esporte e do ideal olímpico que se adquire o “homem completo”.



                 Havia uma alternativa a mais então para os planos da Política Externa Independente: patrocinar em terras brasileiras uma competição esportiva de nível mundial. Por isso que foi trazida a Universíade-63 para o Brasil. Através dela se conseguiria uma excelente divulgação do Brasil para o restante do mundo. Afinal, a Universíade tinha todas as características de uma Olimpíada. O mundo estaria com suas atenções voltadas para o Brasil, o que constituiria um marco interessante para novas relações comerciais internacionais.
                   Desse modo, houve uma intencionalidade por parte do governo, especialmente o Governo Jânio Quadros, na busca da Universíade para o Brasil. Através dela, seriam favorecidos os contatos para novas relações comerciais com outros países, mesmo que ideologicamente diferentes do Brasil.
                   Mas por que Porto Alegre sediar esses Jogos? Porto Alegre estava em um momento particularmente privilegiado. Por terem sido realizados no mesmo ano os Jogos Pan-Americanos em São Paulo, a grande metrópole estava descartada de qualquer possibilidade de sediar a Universíade-63. Minas Gerais tinha um belíssimo estádio, há pouco construído, o Mineirão. No entanto, não teve força política suficiente para garantir a conquista. Porto Alegre teve. Suas entidades de esportes estudantis tinham peso político com as entidades nacionais. A cidade queria o evento. E o Governo do Estado investiu de forma pesada para viabilizar os Jogos Mundiais Universitários. Mesmo sendo um governado de oposição ao governo central do Brasil, o Governador Ildo Meneghetti viu na idéia dos Jogos um forte componente político. Para ele era uma boa forma de promoção. Tratou de pôr a estrutura do Estado a favor da Universíade, contando inclusive com ativa participação do Secretário da Fazenda do Estado na realização dos Jogos.



                   Para a cidade foi bom. Ela esteve no centro do mundo por alguns dias. Estabeleceu relações sociais com pessoas de diferentes procedências, o que foi muito enriquecedor para parte da população que pode se integrar ao evento. E também foi bom em termos econômicos, pois os atletas e membros da imprensa mundial fizeram muitos gastos aqui, e uma propaganda positiva da cidade para o mundo. Além disso, a cidade ganhou importantes espaços de integração esportiva, sendo o maior deles o Ginásio Universíade.
                   Por fim, através da Política Externa Independente, que mesmo não atingindo plenamente suas ambições por particularidades históricas bem conhecidas, o Brasil se integrou ao mundo e ajudou na busca pela paz, pelo congraçamento dos povos e, se não houve o crescimento econômico almejado e sua indispensável distribuição de renda, ao menos houve uma história de luta pela igualdade, de resistência e de não-subordinação àqueles que há muito nos exploram.

FONTES PRIMÁRIAS
Boletim da Universíade-63. Porto Alegre, Números 01, 03,04. Agosto e setembro de 1963.

Jornal Correio do Povo, Porto Alegre, edições de agosto e setembro de 1963.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARRAVETA, Elio Salvador. O Esporte olímpico. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1997

DOMINGOS, Charles Sidarta Machado. O Brasil e a URSS na Guerra Fria: a Política Externa Independente na Imprensa Gaúcha.

FONSECA, Pedro Cezar Dutra. A crise do Governo Goulart: uma interpretação. In: Encontro Nacional de Economia Política. Anais [recurso eletrônico]. Uberlândia: SEP, 2004, 28p.
KOCH, Rodrigo. Universíade 1963 – História e resultados dos Jogos Mundiais Universitários de Porto Alegre. São Leopoldo: Editora da Unisinos, 2003.

NOGUEIRA, Maristel Pereira. Universíade de 63: reconstrução da memória através da perspectiva dos jornais. Porto Alegre: Dissertação de Mestrado, PUCRS, 2004.

TRINDADE, Hélgio; NOLL, Maria Izabel. Rio Grande da América do Sul: Partidos e eleições (1823-1990). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1991.



* Este texto é uma síntese do artigo publicado no número 4 da Revista Monographia da FAPA. www.fapa.com.br/monographia
** Professor de História no Instituto Federal Sul-rio-grandense – Campus Charqueadas.
[1] O projeto político do presidente João Goulart pode ser descrito como tendo caráter nacional-reformista em razão de pugnar a interferência do Estado na realização de reformas sociais, políticas e econômicas, visando ao desenvolvimento do país. Para esse fim foram importantes a sistematização da Política Externa Independente, a criação do 13º salário, o Estatuto do Trabalhador Rural – que levava os direitos sociais aos trabalhadores do campo –, a Lei da Remessa de Lucros (que limitava o envio de capitais para o exterior) e a criação da Universidade de Brasília (UNB) e Eletrobrás.
[2] Conforme Hélgio Trindade e Maria Izabel Noll, o Estado do Rio Grande do Sul, desde a Guerra Farroupilha (1835-1845) tem uma conformação política assentada em um sistema multipartidário de polarização. No pós-1945, essa confrontação se dará entre o PTB e o anti-PTB (TRINDADE; NOLL, 1991, p. 68-81).
[3] Conforme Pedro Fonseca os índices de inflação para os anos de 1961, 1962, 1963 eram, respectivamente, de 47,8%, 51,7%, 79,9%. Em 1964 o índice chegou a 92,1% de janeiro a dezembro (FONSECA, 2004, p. 1).
[4] A denominação Estádio Olímpico Monumental foi dada em meados da década de 1970, quando na gestão de Hélio Dourado foi construído o anel superior do estádio que seria palco de grandes conquistas na década de 1980.

A Bela do Sábado de Tarde


Alice Krige

Atriz Sul-africana com vários trabalhos no cinema e televisão.
Participou da série Star Trek





Trailer - Carruagens de Fogo

domingo, 22 de maio de 2011

Homens Brancos Não Sabem Enterrar


Dia 28/05
Sala Redenção - 15:30

As cores da civilização: EUA, que país é este?

Homens Brancos Não Sabem Enterrar (White Men Can’t Jump). 1992.


Conheça os Palestrantes

Nilza Silva é psicóloga formada pela UFRGS. Participou como palestrante de 2 ciclos de cinema.











Walter Günther Rodrigues Lippold é Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, possui graduação em História pela Faculdade Porto-Alegrense de Educação Ciências e Letras (2003). Tem experiência na área de História, com ênfase em História Moderna e Contemporânea, atuando principalmente nos seguintes temas: História da África e Diáspora Africana, Cultura Afro-brasileira, História da Música e Educação, Ensino de História e Eurocentrismo.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/9363438914171650

Um olhar sobre o Basquete

Um olhar sobre o Basquete

Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que sou casado com uma historiadora, logo, ao invés de correr o risco de cair na mesmice do "é preciso saber a história para traçar um futuro melhor", ao qual já fui criticado diversas vezes pelo argumento pouco original, deixo aos historiadores a tarefa de contar o surgimento dessa prática desportiva ;o).

Dito isso, sem mais delongas, vamos direto ao ponto: o basquete.

Sou muito mais aprecidador de basquete do que de xadrez, mas certa vez, durante uma partida com um amigo, que também joga basquete comigo, me peguei traçando um paralelo entre os dois esportes. Neste ponto já posso imaginar você pensando: "Pronto, pirou!!". Calma, calma, seguem aqui minhas percepções:

Assim como no xadrez, no basquete você tem um determinado tempo para efetuar sua jogada.
Assim como no xadrez, quem ocupa melhor a "quadra", leva vantagem sobre o oponente.
Assim como no xadrez, quando tudo parece perdido, uma jogada pode determinar uma reviravolta na partida.
Assim como no xadrez, a decisão pode vir nos segundos finais.
Assim como no xadrez, quem não entende, detesta, mas quem entende, ama.
Assim como no xadrez, estudar o seu adversário é fundamental.
Assim como no xadrez, ter uma boa estratégia e estar atento aos detalhes, pode lhe garantir a vitória.
Assim como no xadrez, o armador por vezes é o rei, por vezes a rainha, a peça central, a mais importante, a que pensa o jogo.
Assim como no xadrez, os alas ora são bispos cruzando a quadra com elegância para bandejas certeiras, ora são peões, enfrentando gigantes no garrafão.
Assim como no xadrez, os pivôs ora são torres aplicando um Roque, deixando o garrafão praticamente impenetrável, ora são cavalos, com sua incrível habilidade de transpor obstáculos ainda maiores.
Assim como no xadrez, as derrotas se apresentam nos detalhes, na desatenção.
Assim como no xadrez, o prazer de uma boa partida, ganhando ou perdendo é inenarrável.

Enfim, dia desses acompanhando um telejornal local, acompanhei uma reportagem onde exibia no Reino Unido um novo esporte que vem se popularizando, o Chess Boxing. Nesta modalidade as partidas de xadrez são disputadas num ringue onde posteriormente os mesmos atletas que a disputam enfrentam-se também no boxe. Mal posso esperar para algum outro lunático criar a modalidade de Chess Basketball ;o).

Ok, ok, uma fala um tanto quanto piegas, eu sei, mas quando entro em quadra, quando chego num parque para praticar o tal "basquetebol arte", quando assisto aos jogos do basquete nacional ou americano pela TV, é assim que vejo esse esporte. Uma paixão que além de me expor a pieguice é também minha válvula de escape. Indo mais além, me dá um certo prazer quando, ao chegar no parque da Redenção para bater uma bolinha, vejo uma gurizada, iniciantes nos esportes, escolhendo o basquete e não apenas o futebol. Uma geração Internet que se "fantasia" com bermudas compridas abaixo do joelho, camisetas de clubes da NBA ou da NBB, tornozeleiras, joelheiras, protetores diversos e passam a tarde se divertindo em quadra.

Basta dizer que meu filho de 1 ano e 3 meses já tem duas bolinhas infantis e uma tabela no quarto. Isso é claro, tirando o fato do papai e da mamãe terem um "escritório esportivo", onde a coleção de bolas e medalhas se perdem meio aos livros de história e de TI. Certa vez, categorizando as amizades numa rede social, vi que num universo de 550 amizades, cerca de 280 conheci graças ao basquete. Ou seja, além de me manter magrinho, me desestressar e me divertir, ainda me dá a oportunidade de fazer amigos. Trata-se realmente de um esporte completo.

Como nem tudo na vida são flores, quem é praticante sabe das dificuldades que é encontrar um lugar para jogar basquete. O basquete não é como o futebol, onde cada praça tem duas traves e, se não tiver, improvisa-se uma goleira com chinelos ou tijolos. O basquete precisa obrigatoriamente de uma estrutura com tabela e aro e que frequentemente é disputada de forma ferrenha justamente com o pessoal do futebol. Sério? Sim, sério, pois geralmente nessas quadras onde existe estrutura de basquete concomitantemente com traves de futebol, a modalidade que chegar primeiro leva a quadra o dia todo. Isso sem contar que, se 10 pessoas chegam para jogar basquete e 20 chegam para jogar futebol (o que é mais comum), impera a lei do mais forte, ou melhor, dos mais fortes e numerosos ;o) Além disso, durante uma partida de basquete, disputar rebotes onde estão fixadas as traves de futebol, é um convite à lesão, principalmente se o jogo for bom. O que acaba acontecendo, é que o pessoal do futebol depreda os aros de basquete, para que a quadra seja exclusivamente deles. É por isso que as quadras do parque Marinha do Brasil, da Redenção, do Parcão e outras quadras que possuem apenas a estrutura para a prática do basquete e não de outros esportes recebem inúmeros frequentadores e se tornam principal ponto para quem quer bater uma bolinha.

Quem não é apenas praticante, mas apaixonado, sabe do prazer que é entrar sozinho numa quadra de basquete, e aliviar todas as suas tensões ouvindo o quique da bola, arremessando várias e várias vezes, 20, 50, 100, 200 vezes, até braços e ombros começarem a reclamar. Então seu cérebro diz: "Oh oh, perdi a conta, estamos no 198º ou no 199º arremesso?". E você responde: "Também não sei, mas sem stress, começamos de novo". Ouvir o barulho da bola entrando na redinha sem enconstar no aro, o famoso "Chuá", é uma das "n" coisas da vida que não tem preço. Se tivesse, eu com certeza pagaria. Assistir a uma partida, onde uma das equipes passa o jogo inteiro correndo atrás do placar e consegue uma virada nos segundos finais, ganhando por um único e mísero pontinho, é uma das experiências mais engrandecedoras que um aficionado por esportes pode acompanhar; o que dirá, viver. Além de ser é claro, uma aula de força de vontade, de saber que antes do apito final, podemos tudo. Jogar basquete é conhecer a superação da condição física humana, saber que o homem é capaz sim de voar, e por muitas vezes, desafiar leis da física; quem já ouviu os nomes Micheal Jordan, Kobe Bryant, Lebron James, entre tantos outros, sabe bem do que estou falando.

Basquete é vida. Vida longa ao basquete.

Cristiano Goulart Borges

A bela do sábado de tarde




Tyra Ferrell

Atriz com vários trabalhos no cinema e na televisão.


Trailer

domingo, 15 de maio de 2011

Sábado dia 21/05!!!

“Os seus, os meus, os nossos”:
mito, esporte e os ídolos na vida cotidiana.

            O caminho de San Diego (El camino de San Diego).
2005. Direção: Carlos Sorin


Conheça os palestrantes

Álvaro Antonio Klafke é Doutor em História pela UFRGS, onde também atuou como professor substituto. Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Brasil Império, atuando também nos seguintes temas: Teoria e Metodologia da História, História regional, História do Rio Grande do Sul, formação do Estado e da Nação, História Moderna, História da Cultura, Cultura brasileira, Patrimônio Histórico-cultural, cidades, modernização, História da imprensa. Foi centroavante do Futebol Clube Santa Cruz e da equipe dos professores de História os “Jurássicos Futebol Clube”.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/6592664269677670










Arlei Sander Damo é professor de Antropologia na UFRGS. Autor dos livros "Do dom à Profissão: a formação de futebolistas no Brasil e na França" (HUCITEC) e "Futebol e Identidade Social" (Editora da UFRGS), e co-autor com Ruben Oliven de "Fútbol y Cultura" (Norma, Buenos Aires). Publicou mais de 17 artigos e 11 livros. Atuou no meio campo da equipe dos professores de História os “Jurássicos Futebol Clube”.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/9535835543378743

O caminho de San Diego e a Odisséia de Benítez

O caminho de San Diego e a Odisséia de Benítez

Gerson Wasen Fraga*

A primeira vez que tomei conhecimento da existência de O Caminho de San Diego (Argentina, 2006; direção por Carlos Sorín) foi através do material de divulgação do ciclo de cinema “Vida é Jogo, Jogo é História! Esporte e Civilização”. Até então, a película que narra a odisséia do jovem Tati Benítez (com o objetivo de presentear o ídolo Diego Maradona com a raiz de Timbó cuja forma natural se assemelha, na opinião do protagonista, ao rosto do jogador) me passara completamente despercebida. E talvez assim continuasse, não fosse pela postagem do trailer do filme no blog. Não foi necessário uma segunda exibição das cenas para que eu me desse conta de que estava diante de um filme diferente, sensível, que se destaca não pelos cenários mirabolantes, por explosões ou perseguições. O Caminho de San Diego, pelo contrário, me prendeu pela sua natureza muito próxima aos filmes de documentário, explorando a realidade através dos atores amadores, de cenas que poderíamos muito bem presenciar em uma rápida incursão ao interior do país vizinho. Cenas de pobreza mas também de fé. De trabalho e da eterna espera por uma recompensa qualquer, que pode ser tão simbólica quanto a visita de um grande time da capital a uma perdida cidade do interior. Cenas não só da Argentina, mas de um país latino-americano qualquer, onde as raízes históricas que explicam as diferenças entre o interior e o centro vêm desde os tempos de Facundo e da Regência. E onde as efêmeras ligações em torno de um objetivo comum encontram uma rara oportunidade de concretização através do esporte.
Lamentavelmente, não pude estar presente na tarde em que o filme foi exibido. Para além do filme em si, me interessava muito ouvir os comentários do Álvaro e do Arlei, dois craques, dois jovens craques na área das Ciências Humanas, que poderiam muito bem receber cada um uma camisa dez jogando pelo mesmo time. Me resta apenas o prazer de desfrutar suas linhas neste livro. Contudo, graças aos organizadores, ganhei na semana seguinte uma cópia do filme. E foi então que tive a certeza absoluta de estar diante de uma obra de rara sensibilidade.
O Caminho de San Diego não é um filme sobre futebol. Ou não é apenas um filme sobre futebol. É um filme sobre a relação apaixonada entre o torcedor e seu ídolo. Relação unilateral, normalmente não correspondida, mas nem por isto menos importante. E aqui me saltou aos olhos uma das grandes virtudes da obra de Sorín: Tati Benítez não é um estereótipo, como os brutamontes enlouquecidos das barras bravas, nem o jovem sem perspectivas de vida que encontra na paixão por seu clube uma razão para viver. O protagonista é homem simples, poderíamos dizer mesmo “comum”, com sua necessidade de trabalho, com sua família para alimentar, com seus amigos e vizinhos que encontra em horas de folga ou aperto. Tati Benitez poderia ser qualquer um de nós, que temos no jogo um motivo de gozo e sofrimento, mas que sabemos o quanto ele se faz importante em nosso cotidiano.
Algo que chama a atenção ao longo do filme serena com que o protagonista vai ganhando a simpatia e a confiança das pessoas que vai conhecendo ao longo de sua jornada. O motivo principal não está em seu sorriso humilde, em um carisma sempre difícil de definir. A razão está na missão auto-imposta que lhe conduz à distante capital argentina. Aquilo que a princípio parece uma loucura solitária vai se mostrando ao longo do filme como um movimento do qual toda uma sociedade faz parte. Em outras palavras, é a ideia da comunidade imaginada que transparece e se materializa a cada vez que Tati Benítez ouve uma palavra de incentivo. Em cada um dos companheiros de viagem  que ele encontra, há algo a ser dito sobre o ídolo em questão, sobre a relação com o esporte, enfim, sobre o pertencimento a um mesmo grupo social, preocupado naquele momento com o que poderia vir a ser um momento decisivo na vida de Diego Armando Maradona.
E o que faz Maradona ser este ídolo na vida do jovem Benítez? A pergunta não é tão simples, e poderia muito bem ser estendida da seguinte forma: o que faz Maradona ser um ídolo para os argentinos? O que faz Garrincha ser ainda hoje um mito para os brasileiros? O que fazem os Portaluppis, os Valdomiros, os Romários, os Leônidas, os Helenos, para assumirem o posto de ídolos de uma coletividade de torcedores mesmo após o fim de suas carreiras? As respostas podem ser muitas, indo desde à exposição na mídia ao sucesso pessoal na carreira. Acho que vale ressaltar outro fator: o caráter absolutamente humano que possuem. Benítez, com efeito, não busca seu ídolo no momento da alegria. Sua jornada, ao contrário, se inicia quando descobre que Maradona talvez esteja jogando a última partida de sua vida: a partida pela própria vida. Benítez não vai em busca do inatingível. Ele sabe do lado de Maradona, no fundo, é tão humano quanto ele mesmo.
Ao mesmo tempo, o ato de levar a raiz de Timbó a Maradona só pode ser compreendida enquanto gesto do agradecimento. Não se trata de uma raiz mágica, de algo que inexplicavelmente vá curar Diego ou transportá-lo novamente a uma idade de ouro que àquela altura já havia terminado. Benitez quer simplesmente agradecer. Agradecer a beleza do gols, dos dribles, das vitórias. Agradecer, em suma, a felicidade que o atleta, guerreiro contemporâneo, trouxe a sua existência a cada jogada imprevisível, a cada vitória que lhe trouxe algum significado nos fins de semana cheios de vazios.
Em sua simplicidade, Benitez consegue compreender o significado do esporte como algo que vai além de uma simples atividade física. Ele compreende sua beleza de seu lado humano, cheio de alegrias, mas também de suas pequenas tragédias. Benítez, ao seu modo, é também um craque.  Merece o dez que carrega nas costas.


* Professor de História na UFFS-Erechim. gwfraga@terra.combr


Entrevista com Carlos Sorín

 
Cines Argentinos (C A):- ¿Originalmente esta historia la concebiste con la figura de Eva Perón?
Carlos Sorín (C S):- Si, había hecho un bosquejo allá por 1997 inspirado por el libro "Santa Evita" de Tomas Eloy Martinez. En un capítulo hablaba de las proezas que la gente hizo para salvar a Evita en su agonía.Mi historia trataba de dos hacheros que traian a Buenos Aires un tronco de timbó cargado en el hombro. Un típico ejemplo de pensamiento mágico.Cuando Maradona se enfermó en el 2004 mucha gente vino en peregrinación a la clínica reproduciendo el mismo sentimiento de aquellos que llegaron hasta Evita para darle su apoyo.

C A:- A diferencia de tus últimos trabajos cambiaste las rutas del sur por el noreste argentino ¿Cómo viviste la experiencia de filmar en la selva de Misiones?
C S:Dejé de padecer el polvo y el viento para padecer el calor y los insectos. No se si fue un buen cambio. Pero mi escenario es siempre la ruta, con sus paradores,estaciones de servicio,moteles. No es muy importante que hay a los costados de la ruta. Pueden ser desiertos,pueden ser montañas,puede ser la selva.Y mis films siempre terminan siendo un viaje. Por supuesto no son viajes de turismo. Para mis personajes esos viajes son esenciales, tienen que ver con sus dramas.


C A:-¿Fue difícil encontrar a los actores de esta historia en esta región?
C S: No. Es más fácil que en la Patagonia.En primer lugar porque hay más gente,son zonas más pobladas y también porque la gente del noreste es muy comunicativa.Es fácil relacionarse con ellos.

C A:- ¿Cúal es el secreto para lograr esa espontaneidad en personas que, en su mayoría, nunca se pararon frente a una cámara?
C S: La clave fundamental es tener suerte.Suerte de encontrarlos y suerte que les salga lo que uno quiere.Después es necesario tener paciencia.Esperarlos.Dejarlos que les pasen las tensiones y puedas tomarlos desprevenidos.Mi función quitarle la tensión que le viene a cualquiera que no sea actor,cuando le pones una cámara adelante.Es necesario tener mucho tiempo y estar dispuesto a cambiar aspectos del personaje si a la persona que lo interpreta no le sale.Y lo fundamental:el personaje y la persona deben ser muy parecidos.


C A:- ¿Por qué elegiste el formato de documental para presentarnos al protagonista el "Tati " Benítez?
C S: Era una forma clara y franca para que el espectador sepa todo lo que tiene que saber del protagonista antes que empiece la historia. Sino hubiese sido mucho más largo y engorroso.Hubiese tenido que crear situaciones y contrabandear información. En "la Pelicula del Rey" hice algo parecido:comienza con un reportaje que dos periodistas le hacen a Julio Chavez y en ese reportaje pongo todo lo que el espectador tiene que saber sobre el rey de la Patagonia. En "El Perro" tambien hice algo parecido.Casi en el comienzo el protagonista es entrevistado por el dueño de una agencia de trabajo y este le pregunta todo lo que el espectador tiene que saber de Juan Villegas.

C A:-El camino de San Diego representa otro avance en la carrera actoral de Pascual Condito, ícono de la distribución cinematográfica argentina. ¿Sus personajes de hombres malhumorados son autobiográficos?
C S: Digamos que ese tipo de personaje le cae muy bien.Como un traje hecho a medida.De cualquier manera Pascual es una persona muy emotiva y en las próximas películas lo tendré que explotar más esa veta.


C A:- ¿Es cierto que una de las actrices que interpreta una prostituta tenia miedo que el rodaje fuera una mentira y la terminaran secuestrando?
C S: Si, yo estuve presente en el momento que ella llegó a Curuzú Cuatia para integrarse al equipo. Estaba paranoica. Creian que todo estaba armado para secuestrarla. Pero no podia dejar de venir,por las dudas.Y en cierto sentido sus temores eran razonables:quién podia pensar en ella para una película?.Era mas verosimil que se tratara de una trampa.Sin embargo,habiamos pensado en ella para la película...

C A:-¿Ya tenés programado el "San Diego World Tour" en dondes vas a presentar la película? Una historia que gira en torno a Maradona no sólo despierta interés acá, ¿no?.
C S: Vamos al Festival de San Sebastian y ahí podré darme cuenta como responde el público no argentino.Y si bien Maradona es una personalidad de alcance internacional, la pelicula no trata de Diego, sino de un fan.La noche del 23 de septiembre,cuando se exhiba oficialmente en el Festival podré darme cuenta que pasa con la pelicula en el ámbito internacional.
Entrevista de Hugo Zapata


A Bela do Sábado de Tarde


María Marta Alvez, encontrada no caminho das filmagens fez sua primeira aparição diante das câmeras


Poster


Trailer O caminho de San Diego

sábado, 7 de maio de 2011

O Milagre de Berna

Sábado dia 14/05

Por trás das linhas de cal surge os caminhos do nacionalismo alemão: passado, presente e futuro pelo cinema.

O Milagre de Berna
(Das Wunder von Bern). 2003. Direção: Sönke Wortmann


Conheça os Palestrantes

Gerson Wasen Fraga é professor de História na UFFS, em Erechim. Graduou-se pela UFRGS onde também fez o mestrado. Pela mesma instituição realizou o doutorado, defendendo em 2009 a tese “A derrota do Jeca na imprensa brasileira: nacionalismo, civilização e futebol na copa do mundo de 1950”, primeira tese realizada no RS sobre história e futebol. Publicou mais de  4 livros e  8 artigos em periódicos especializados.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/0751889477523062






Maurício Borsa dos Santos é graduado em História pela UFRGS. Ingressou no mestrado em 2011, com a pesquisa “O futebol vira notícia: um lance da modernidade. Uma história do futebol em Porto Alegre (1922-1933)”. Atuou como professor em Campo Bom e Porto Alegre.
Para acessar seu currículo: http://lattes.cnpq.br/9236585396894755

O Milagre de Berna: a História da Copa de 1954

A família milagrosa de Berna
Fagner dos Santos[1]

O Milagre de Berna (Das Wunder von Bern) é uma produção alemã, lançada em 2003, dirigida e escrita por Sönke Wortmann. Embasa-se na histórica vitória de 3x2 da seleção germânica na final da copa de 1954 para contar tanto uma história de superação de uma seleção sem estrelas, porém unida, quanto o retorno da vida em família de um país recém-destroçado pela Segunda Guerra Mundial. Em especial, além de uma campanha claudicante e resultados contestáveis, uma atuação redentora contra a sensação da competição, a Hungria, de Frenc Puskas, de quem havia perdido por um humilhante 8x3 na primeira fase da competição, traz o retorno da alegria da população ao ver a seleção nacional ganhar o mundo agora em um campo mais honroso que o de batalha: o do futebol.
O filme que levou mais de três milhões de espectadores aos cinemas alemães, contou com a sorte de ter sido lançado em um momento muito favorável. Mesmo que tenha sido parte do movimento de preparação da população para a copa de 2006, que seria sediada pela segunda vez na Alemanha, ninguém acreditava que, em 2002, a seleção de camisas brancas e calções negros seria finalista em uma situação similar àquela em um torneio mundial – ou seja, como “zebra”, contra uma seleção muito poderosa. Além disso, o falecimento do capitão daquela seleção, Fritz Walter, durante a Copa do Mundo disputada no Japão/Coréia, também ajudou a reviver aquela história de superação de uma Alemanha recém-saída da destruição da Segunda Guerra para o seu primeiro título mundial.
Essa intenção de mobilizar os torcedores para uma participação em massa no torneio ficou manifesta principalmente na escolha técnica de ambientação histórica do filme. A película tentou emular os fatos embasando suas reconstituições com os pedaços disponíveis da transmissão original de 1954 sem, contudo, deixar de tomar algumas licenças. Não houve reaproveitamento das cenas originais, mas composições ensaiadas dos lances, o que levou a algumas jogadas que, completamente fora de contexto, em alguns momentos fabricaram a impressão que a Alemanha, a partir do fervor de seus torcedores depois de instaurada a desvantagem de dois gols no placar, passou a esbanjar técnica. Um exemplo marcante disso foi o momento em que um zagueiro, sozinho, dá uma “chaleira” sobre si e passa para o seu colega matar no peito e sair jogando. O vídeo oficial dessa Copa do Mundo mostra que, na verdade, foi o recurso de um jogador que, passando da bola, se recupera, em uma jogada que aliou a sorte com a técnica, mas que contava com mais dois jogadores húngaros que passaram errado após já ter praticamente se livrado do defensor.
Outro ponto interessante nas “liberdades” tomadas pelos autores é a maior valorização de Helmut Rahn em relação a Fritz Walter, capitão da equipe. Após o final da Copa do Mundo, os alemães se renderam a Walter e o exaltaram como o “patrão” da seleção, muito em função de ser a voz do técnico como liderança entre os jogadores. A obra mostra esses detalhes, principalmente ao encenar os passeios que ele fazia ao lado do treinador, Sepp Herberger, onde discutiam táticas e a escalação para a próxima partida – fruto de uma cena do filme oficial da Copa que mostra os dois andando lado-a-lado. Porém, a importância dada no filme a Rahn, autor de dois gols na final e outros importantes durante a competição, parece ser como uma recompensa tardia a um craque deixado de lado pela memória da bola em relação à figura de Walter, para muitos, o maior responsável por colocar o “chefe” no espírito da seleção e do grupo[2].
Essa escolha também evidencia uma alteração dos valores no futebol na virada para o século XXI. Aos poucos sai de cena o “futebol total” da Holanda, que valoriza o coletivo e o esforço em função do esquema tático e começa a ganhar força a figura do “diferencial técnico”, um jogador capaz de desequilibrar a partida, mesmo que sem muita disciplina ou espírito de equipe. De fato, Rahn, criticado no filme durante o intervalo por ter chutado uma bola que teria muito mais chances de entrar no gol se fosse cruzada para um companheiro (cena que não foi dramatizada, mas está no filme oficial), pode ser encarado dessa forma. Frente à dificuldade de furar a defesa de uma equipe que marcava muito a saída de bola, a Alemanha fugiu de suas características ao longo da competição e, não conseguindo entrar com seus passes curtos na área, viu em seu camisa 12 o desafogo ao finalizar mais de cinco vezes de fora da área. O último gol do jogo saiu justamente dessa insistência: o único chute disparado de perna esquerda surpreendeu o goleiro e os marcadores e atingiu a meta, decretando a vitória dos alemães.
Mesmo assim, a imagem da seleção unida em torno de um sábio técnico e as modernas técnicas do futebol também ganha destaque nesta obra. O primeiro ponto principal é a preparação física que teria padronizado a força da equipe. O segundo foi o advento dos jogos de travas atarraxáveis para chuteiras que possibilitavam maior estabilidade ao jogador em qualquer tipo de terreno. Esses foram apontados, indiretamente, ao longo do filme, como responsáveis pela igualdade encenada na disputa quando a chuva tornou o gramado mais pesado[3]. Há, inclusive, a cena da chuva que surge em meio a um dia ensolarado, mostrando que a única esperança que tinham de fazer um bom jogo estava renovada com a mudança repentina de condições do gramado em Berna.
Porém, a paridade foi evidenciada apenas na pequena diferença no placar. O goleiro Toni Turek foi a figura do jogo, realizando um milagre no primeiro tempo e outros três (22”, 33” e 45”) na segunda etapa. Embora a reconstituição da narração faça justiça ao goleiro alemão, a dramatização do filme não faz jus a complexidade das defesas que ele realizou. Além disso, um zagueiro tirou a bola da direção do gol, a um passo da linha fatal, com Turek já vencido por Puskas aos 10” e uma vez em cada etapa a bola explodiu na trave alemã. A Alemanha criou lances de perigo apenas no primeiro tempo, forçando o arqueiro húngaro a uma defesa incrível e acertando a trave uma vez. A Hungria parecia, pois, mais bem preparada para aguentar o gramado encharcado e a velocidade impressionante da partida durante os noventa minutos. Se o futebol fosse um esporte lógico, o segundo tempo daquele jogo teria outro vencedor.
Outra escolha da direção do filme digna de nota foi a opção por não mostrar o lance anulado do gol de empate da Hungria, quando o auxiliar marcou impedimento de Puskas aos 42” da segunda etapa. O goleiro húngaro reclamou rispidamente com o árbitro antes de parabenizar os alemães depois do apito final, mas, no momento da anulação, não houve muitos protestos. Porém, esse não foi o único lance polêmico desta edição da Copa: na fase de grupos houve um pênalti assinalado para a seleção da França que, embora ficasse marcado na posteridade pela locução do vídeo oficial do evento, não despertou maiores protestos dos jogadores no momento da marcação. Ou seja, a ausência de pressão dos jogadores ao juiz durante a partida parece ser mais uma questão de respeito do que a concordância com o seu posicionamento, o que torna difícil aceitar que a cena da anulação não tenha sido posta no filme.
Como o futebol não pode ser descolado da sociedade, diversos pontos interessantes podem ser traçados com a história paralela do filme sobre a reorganização da vida na Alemanha do pós-guerra. Porém, a direção do filme acabou se debruçando mais sobre o papel da família na sociedade. Richard, o pai que mantinha a família Lubanski, protagonista da história, foi para o front da Segunda Guerra e, ao final, com a derrota, foi feito prisioneiro dos soviéticos, passando por trabalhos forçados, fome e maus tratos. Christa, a matriarca, precisou, assim, garantir o sustento da família de uma maneira alternativa, abrindo um restaurante e colocando os filhos para trabalhar desde novos. Onze anos depois, quando retorna, Richard precisa se adaptar aos traumas da guerra e a essa nova organização familiar, com mais independência para a mulher. Além disso, ter a aceitação dos filhos já desacostumados com o tempo e as noções de respeito, hierarquia e disciplina que ficaram congelados na memória do ex-soldado.
A relação mais significativa foi representada no confronto de gerações entre Bruno, o filho mais velho, e Richard. O primeiro tornou-se músico e tocava no restaurante da família a nova sonoridade das bandas de rock dos Estados Unidos. Este personagem traz, acima de tudo, a novidade, caracterizada também com uma rebeldia contra a geração precedente, mesmo que incoerentemente. Ao mesmo tempo em que toca os sucessos de Chuck Berry e do capitalismo estadunidense, diz-se admirador das doutrinas da Alemanha Oriental e seu comunismo igualitário, onde há empregos para todos e todos ganham da mesma forma. Por outro lado, atira nas costas de seu pai a responsabilidade pela guerra, considerando-o um nazista. Richard, porém, não se coloca como um nazista, mas como alguém que cumpriu o seu dever mesmo sem concordar. O momento desse diálogo é bastante rápido, mas dá uma resposta provisória e prévia a críticas que sempre são feitas à falta de referências dos alemães ao período nazista.
Como outra faceta das famílias do pós-guerra o filme apresenta os perigos da ausência do pai e a busca de alguém para fazer o papel de tutor. Isso é escancaradamente colocado na relação entre o filho mais novo, Matthias, e Rahn, “o chefe”. A posição cristã-ocidental de orientação desta instituição foi mostrada na imperícia do jogador em reconhecer as reais virtudes de seu pupilo, ao estimulá-lo a ser atacante como ele. O “verdadeiro” pai, mesmo sem conhecer o garoto, nascido depois que ele foi para o front é quem, observando, aconselha-o a mudar para a zaga, fazendo-o tornar-se respeitado pelos seus amigos. Além disso, recuperou a sua posição de herói ao levar o garoto à final do campeonato, depois de uma série de deslizes. Apenas à sabedoria do pai, que reconquistava a sua família aprendendo a ceder aos novos tempos, isto seria possível.
Da mesma forma, Sepp Herberger levava a sua seleção como uma grande família. A cobrança sábia e na medida certa, bem como o carisma nas entrevistas ao desarmar as perguntas mais capciosas nos momentos de crise, defendendo o time de qualquer culpa nos resultados, mostram um devir de comportamento paterno personalizado na conversa despropositada com a faxineira do hotel suíço que, com a sua sabedoria de mãe, aconselha o pai a ser menos severo com o seu filho mais travesso, Helmuth Rahn, recém-descoberto “de porre” às portas da concentração. E é com a missão de “irmão mais velho” que Fritz Walter é colocado no mesmo quarto e busca, com a promessa de comprometimento, convencer o treinador a não sacrificar um de seus melhores jogadores por indisciplina. Em suma, a mensagem da família estruturada e tradicional é passada à exaustão, durante todo o filme.
Se, por um lado, a preocupação com a coreografia dos lances originais da Copa da Suíça, a reconstituição do estádio já inexistente de Berna e a qualidade da ambientação foram justamente exaltados pela crítica no seu lançamento, O Milagre de Berna assume com toda a sua força o papel de propaganda da Copa na Alemanha quando mostra a comemoração do título. Abraços calorosos, muitos gritos e uma festa digna de uma Budesliga repleta de latinos da atualidade podem ser conferidos na tela após o apito do juiz, contrastando muito com o que é visto no filme original da FIFA. Até mesmo o gesto de erguer a taça sobre a cabeça, que será feito pela primeira vez quatro anos mais tarde por Bellini, capitão da seleção Brasileira, na Suécia, foi enxertado na comemoração por ter se tornado marca registrada das grandes conquistas da atualidade.




[1] Mestre em História pela UFRGS. agks@terra.com.br
[2] Os termos “chef” e “boss”, ambos aceitos na língua alemã, foram aqui traduzidos por “patrão” e “chefe” para respeitar a versão brasileira do filme. Helmut Rahn era conhecido como “boss” e Fritz Walter como “chef”.
[3] Hoje em dia, quando o tempo está chuvoso e o gramado está pesado, na Alemanha, define-se esse tipo de clima como Tempo Fritz Walter (Fritz-Walter-Wetter).


A copa em números:



Seleções participantes da Copa do Mundo de 1954 na Suíça
Alemanha Ocidental | Áustria | Bélgica | Brasil | Coreia do Sul | Escócia | França | Hungria | Inglaterra | Iugoslávia | Itália | México | Suíça | Tchecoslováquia | Turquia | Uruguai

Seleções participantes: 16

Tabela e jogos da Copa do Mundo 1954

Primeira fase:
Grupo 1 - 1o Brasil, 2o Iugoslávia, 3o França, 4o México.
Grupo 2 - 1o Hungria, 2o Alemanha Ocidental, 3o Turquia, 4o Coréia do Sul.
Grupo 3 - 1o Uruguai, 2o Áustria, 3o Tchecoslováquia, 4o Escócia.
Grupo 4 - 1o Inglaterra, 2o Suíça, 3o Itália, 4o Bélgica.

Quartas-de-final:
Alemanha Ocidental 2x0 Iugoslávia
Áustria 7x5 Suíça
Uruguai 4x2 Inglaterra
Hungria 4x2 Brasil

Semi-finais:
Hungria 4x2 Uruguai
Alemanha Ocidental 6x1 Áustria

3o Lugar
Áustria 3x1 Uruguai


Final:
Alemanha Ocidental 3x2 Hungria

Local: Wankdorf Stadium, Berna – Suíça

Árbitro: William Ling (Inglaterra)

Escalação da Alemanha Ocidental:
Toni Turek,
Werner Kohlmeyer,
Horst Eckel,
Jupp Posipal,
Karl Mai,
Werner Liebrich,
Helmut Rahn,
Max Morlock,
Ottmar Walter,
Fritz Walter e
Hans Schaefer
Técnico: Sepp Herberger

Escalação da Hungria:
Gyula Grosics,
Jeno Buzanszki,
Gyula Lorant,
Mihaly Lantos,
Jozsef Bozsik,
Jozsef Zakarias,
Sandor Kocsis,
Nandor Hidegkuti,
Ferenc Puskas,
Zoltan Czibor e
Mihaly Toth
Técnico: Gusztav Sebes




Público: 60.000

Gols: Primeiro Tempo - Puskás (6 minutos) | Czibor (8 minutos) | Morlock (10 minutos) | Rahn (18 minutos) | Segundo Tempo - Rahn (39 minutos)